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RUI MANUEL CUCA
O Poeta, Rui Manuel (Cuca), tem a singularidade de ser talvez o primeiro autor africano conhecido, que escreve para o Fado e para a Música Africana (1978), mergulhando as palavras dos seus poemas nas suas raízes angolanas. Longe de dilacerado por esta aparente ambiguidade, soube beber o melhor de dois mundos e converter isso numa vivência única, pelos valores e as raízes que o formaram em África (Soyo). Isto permitiu-lhe uma descodificação que deu origem a um corpo de trabalho que é uma rica combinação de sentimentos poéticos, conferindo à sua obra poética a força e a simplicidade que são fatores-chave da sua personalidade.
Os seus temas são cantados por Dany Silva, Nelo de Carvalho e outros. Entre eles, o célebre Hino a África (“Mamã África”), interpretado por Dany Silva.
No Fado, a sua poesia está na voz de vários intérpretes, merecendo destaque os temas mais cantados como “Morreu um Poeta”, e o disco de Ricardo Ribeiro que inclui o tema “O segredo das Palavras”, considerado um apelo à Paz entre os povos. Alguns destes temas fazem parte do seu livro “Entre Duas Margens”. Participou na “Colectânea de Poetas Lusitanos “A Essência do Amor” Vol.III Edições Vieira da Silva, na “Antologia de Poesia Contemporânea”- Vol. VI – Chiado Editora, “Entre o Sono e o Sonho”. É um dos poetas angolanos referenciado na obra “Autores e Escritores de Angola (1642-2015)” do escritor Tomás Gavino Lima Coelho, editada pela Perfil Criativo. A marca de chocolates “NIGREDO” editou, em 2016, três colecções de chocolates – Fado, Equilíbrio e África – com poesias do autor.
Rui Manuel de Oliveira nasceu em Angola. no Soyo, adquirindo logo em criança a alcunha de Cuca.
Repartiu a sua infância e juventude pelo Bié, Sumbe e Huila, onde frequentou a Escola de Regentes Agrícolas do Tchivinguiro, tendo desenvolvido a actividade profissional no Huambo, Huige e mais tarde no Montijo. Residente em Lisboa desde 1975.
Os seus poemas têm sido cantados por intérpetres diversos, quer na área do fado quer na música Africana, estando alguns deles incluidos neste seu primeiro livro.
Entre Duas Margens
O meu corpo é feito um rio
E distintas são as margens
Que me demarcam o leito.
Na margem africana
Repousam as minhas raízes
E das gavetas da memória
Vão fugindo rostos e nomes
Que me ajudaram
A construir o passado.
Na margém europeia
Fica-me um tempo mais recente
Ao qual lancei gavinhas
Na procura de renascer
Para uma ourea vivência.
Afluentes diversos
Me alimentam o caudal
Numa policromia de amizades
Num casamento de culturas.
Farra na Sanzala
No recinto improvisado
Com emplas de palmeira
O chão de terra batida
Costumava ser regado
Para não levantar poeira.
A luz era dos famosos
Candeeiros de petróleo.
Com gira discos de pilhas
E discos já bem usados
Estava a farra assegurada
Não parava e toda a gente
Queria ver o sol nascer.
A cerveja mesmo quente
Não ficava por beber.
Era a farra na sanzala
Alegria não faltava
E os vaidosos exibiam
Os meus truques nas passadas.
Era a farra na sanzala
Mas o certo é que a cidade
Também ia lá dançar.
Morreu um Poeta
Silêncio,
Hoje morreu um poeta
E a carne morreu esquecida
Como esquecida viveu.
Silêncio,
Hoje morreu um poeta
Que espalhou rimas de vida
Nos poemas que escreveu.
Fez rimar terra com pão,
Emigrante com fronteira
E rimou humilhação
Com repulsa e bebedeira.
Fezum berço de poesia
Bem na ponta dos seus dedos,
Rimou dor com alegria
E crianças com brinquedos.
Fezrimar ponte com rio,
Pescador com tempestade,
Rimou estiva com navio,
Grilhetas com liberdade,
E, na inspiração maior
Que o verso pode conter
Rimou amor com amor
E ternura com mulher.